20 março 2017

Garotas de Papel entrevista Diana Scarpine


No início desse ano tivemos o Garotas de Papel teve o prazer de firmar uma parceria com a baiana Diana Scarpine, autora de Uma Chance Para Recomeçar e Entrelace: Caminhos que se Cruzam ao Acaso. 

Os dois livros trazem protagonista que saem dos padrões, principalmente estéticos, trazidos por boa parte das narrativas. Com personagens psicologicamente complicados e com algum tipo de deficiência física, Diana revela que foi a falta de representatividade e por sempre ser tachado que deficientes são infelizes, que levou ela a escrever romances que desmitifiquem isso.

Nessa entrevista vocês poderão conferir, mas sobre seu processo criativo, seus livros e também como foi sua entrada no mercado editorial.

Diana Scarpine
Garotas de Papel: Como surgiu a vontade de escrever um livro?
Diana Scarpine: A vontade de escrever surgiu quando eu tinha 12 anos de idade. Naquela época, eu não me sentia representada pelos livros que eu lia e gostava muito das aulas de redação do colégio; mas eu não comecei a escrever aí, porque achava que, para ser escritor, era necessário viver grandes aventuras para ter o que contar e minha vida era comum (ainda é. rsrs). Então, um ano depois, eu assisti a um filme antigo (já era antigo na época) chamado “Adorável Sedutora” (“Her Alibi”), que conta a história de um escritor atrapalhado que está vivenciando um imenso bloqueio criativo. O mais importante que percebi no filme é que os escritores são pessoas comuns, que não precisamos viver grandes aventuras para escrever um livro. Foi aí que comecei a escrever: aos 13 anos de idade. Com o tempo, percebi que grandes histórias podem estar no cotidiano das pessoas comuns e que estas histórias podem encantar e emocionar.

GP: Quando você escrever segue algum ritual, por exemplo escrever ouvindo música?
DS: tenho um ritual, mas escrevo geralmente à noite quando me sobra um tempinho (nem sempre sobra), pois ainda não consegui me dedicar totalmente à literatura e tenho outras atividades (ainda não consegui viver de literatura). Mas não escrevo ouvindo música. As músicas surgem na história a partir dos sentimentos dos personagens. Eu me pergunto: o que eu ouviria se estivesse nessa situação? O que embalaria a minha dor, a minha alegria, o meu romance? Foi assim que Chão de Giz de Zé Ramalho se tornou a principal música de Uma Chance Para Recomeçar e que Always on My Mind (Elvis) se tornou a principal música de Entrelace: Caminhos que se Cruzam ao Acaso.

GP: Seus dois livros publicados trazem personagens com algum tipo de deficiência física, o fato de estudar isso te incentivou a escrever sobre o assunto ou tem outra motivação?
DS: Estudar sobre deficiência me ajuda muito a escrever e compor meus personagens; mas o principal motivo é o fato de eu ter uma deficiência física. Lá na pré-adolescência (13 anos), eu não encontrava personagens com deficiência nos livros que lia ou, quando os encontrava, a deficiência era mostrada como um fardo tão pesado que o final feliz só acontecia depois que a pessoa se livrava milagrosamente da deficiência, como se ser feliz com uma deficiência fosse algo impossível (não é). Então, comecei a criar personagens com deficiência para me sentir representada, diminuir a sensação de invisibilidade que eu tinha. Com o tempo, percebi que não bastava me sentir representada, eu precisava também discutir questões relevantes que permeiam o universo das pessoas com deficiência como o preconceito. Foi aí que isso se tornou para mim um projeto literário e uma forma de militância.

GP: No início de Uma Chance Para Recomeçar temos um poema seu com o mesmo nome do livro, ele foi um gancho para a história ou foi escrito depois?
DS: Ele foi escrito depois, já no final da história; pois senti que Carina e Aurélio também precisavam de um poema para ilustrar sua história. No caso de Entrelace, o poema é anterior, foi escrito 13 anos antes da história; mas, quando ela surgiu, eu soube que aquele era o poema certo para Carol e Henri.

GP: Você já tinha uma ideia geral de como seria o desenrolar de Uma Chance Para Recomeçar ou tudo foi surgindo enquanto escrevia?
DS: Quando comecei a escrever, tinha uma ideia geral de como a história seria; mas tive um imenso bloqueio criativo no meio da história, daqueles que dá vontade de deletar tudo que você escreveu e jogar a história fora. Foram vários meses me questionando se eu devia contar essa história e por que ela não estava me agradando naquele momento. Percebi então que o que faltava era tornar a história mais complexa, mais crua, mais real e foi isso que eu fiz.

GP: Carina e Aurélio são pessoas muito diferentes, com personalidades completamente opostas e a narração intercalada entre eles deixa isso muito claro. Algum deles deu mais trabalho quando escrevia?
DS:  Aurélio me deu mais trabalho, tanto pela questão da culpa e pela tragédia que foi ter perdido tudo que ele amava e considerava importante; mas, principalmente, pela deficiência visual. Eu tenho estudado deficiência de uma forma geral, mas atualmente tenho focado muito em deficiência física (minha tese de doutorado é sobre deficiência física e Tecnologia Assistiva e na graduação tinha focado em deficiência intelectual) e, apesar de ter participado de alguns eventos sobre deficiência visual, eu tenho uma deficiência física e eu precisava descrever as cenas e falar dos sentimentos sob a óptica de alguém que tem deficiência visual. Então, comecei a observar mais criteriosamente os cegos e a fazer “laboratório” em casa (andar pela casa de olhos fechados e tentar me localizar, identificar as coisas) e aí o mundo como Aurélio o vê se tornou mais real, mais palpável para mim e eu o coloquei no papel.

GP: Uma das coisas que me chamou muito a atenção em Uma Chance Para Recomeçar é a referência a série Irmandade na Adaga Negra, pois é uma série que gosto muito. Você também é uma fã desse universo criado pela J.R. Ward?
DS: Sim, eu gosto da série da Irmandade da Adaga Negra e já a li quase toda, mas não por ser uma série erótica. O que me fez ler a série e a gostar dela é o fato de que seus personagens principais não são perfeitinhos. Apesar de os irmãos fazerem o estilo  “macho saradão”, eles não são perfeitos (o rei tem  baixa visão/cegueira, Raghe tem uma besta dentro de si, Z tem cicatrizes pelo corpo, Phury é amputado, etc.) e, quando ela coloca uma deficiência ou trauma psicológico  nos irmãos, de uma certa forma, ela quebra um pouco este estereótipo de perfeição e beleza dos homens nos livros. Gosto também da escrita dela, da forma como ela consegue concatenar vários personagens e histórias.


GP: Quais autores você tem como referência?
DS:  A minha principal referência é Machado de Assis; pois amo a maneira como ele conversa com o leitor, o faz participar da história e também a forma como desnuda a psicologia dos personagens. Gosto também da crônica social que Jorge Amado faz e também do fato de ele colocar a Bahia como cenário. Gosto também da escrita de Clarice Lispector, da forma intimista e delicada com que ela aborda os sentimentos dos personagens. Entre os autores internacionais, cito Susanna Kearsley e sua escrita poética e Jan-Philipp Sendker pela forma delicada como ele expõe os sentimentos dos personagens.

GP: Ainda é muito complicado o destaque que as grandes editoras e livrarias dão aos autores nacionais mais novos. Como foi sua caminhada diante desse cenário até ter seu livro publicado por uma editora?
DS:  Não foi fácil e ainda não é; porque as editoras valorizam muito mais os livros e autores internacionais, o que é uma pena porque há muito autores nacionais bons que ainda não possuem o reconhecimento que merecem. Mas eu acho (ou, pelo menos, espero) que as coisas estão melhorando um pouquinho. Quando comecei a escrever, não pensava de fato em publicar (escrevia para eu mesma ler); pois não via publicações nacionais além daquelas de autores mais antigos e consagrados (eu não via publicações de novos autores). Em 2012, quando publiquei a primeira edição de Entrelace, já havia autores nacionais batalhando no mercado e hoje existem muitos mais e alguns deles já conseguiram publicar até por grandes editoras. Então, a sensação que eu tenho é que, se no passado, as portas das editoras estavam hermeticamente fechadas para nós, autores nacionais, hoje há uma pequena brecha nessa porta, por onde alguns de nós já conseguiram passar.

GP: Como tem sido o papel dos blogs parceiros para a divulgação do seu trabalho?
DS:  O papel dos blogs parceiros é muito importante, pois eles me ajudam a divulgar e dar visibilidade ao meu trabalho. Eu tenho lido resenhas lindas e muito bem elaboradas tanto de Uma Chance para Recomeçar quanto de Entrelace: Caminhos que se Cruzam ao Acaso e isso me deixa muito feliz, me dá a sensação que eu estou conseguindo fazer as pessoas se divertirem, mas também refletirem sobre as questões referentes à deficiência.

GP: Diana eu estou completamente encantada por seu trabalho e claro que fico na expectativa de ler mais livros seus, por isso para quando eu, seus leitores e futuros leitores podem esperar um novo livro?
DS: Eu estou com um livro em andamento. Na verdade, estou reescrevendo um livro que escrevi em 2000 (17 anos atrás); mas, como estou mudando muita coisa, o título também será mudado. Então, ele ainda não tem nome e não tenho uma previsão de quando ele será publicado, mas ele vai sair.






Aproveito a oportunidade para agradecer a Thiana do Blog Garotas de Papel pela oportunidade de participar dessa interessante entrevista e para convidar os(as) leitores(as) do Blog Garotas de Papel a conhecerem os meus livros “Entrelace: Caminhos que se Cruzam ao Acaso” e “Uma Chance para Recomeçar”.

18 comentários:

  1. Oi Thiana, tudo bem ?
    EU já vi a resenha deste livro em alguns lugares e de certa forma me chamou a atenção. Gostei da entrevista, é sempre bacana saber como pensa o autor e de onde vem as suas inspirações, rituais de escrita e etc.
    Bem legal.
    Beijos
    www.estilo-gisele.blogspot.com.br

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    1. Oi Gisele,
      É sempre bacana mesmo, até eu fui surpreendida por algumas coisas nessa entrevista. rsrsrs
      Espero que possa ler e apreciar os livros da Diana.

      Bjs

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  2. Adorei participar da entrevista, Thiana!

    Abraço,
    Diana Scarpine.

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  3. Oie...
    Adorei a entrevista!
    Já conversei com a Diana via e-mail e ela é um verdadeiro amor de pessoa! Muito simpática <3
    Gostei bastante de UMA CHANCE PRA RECOMEÇAR e acho que a autora tem bastante talento. Adorei saber que ela, assim como eu, é fã de Machado de Assis.
    Beijos

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  4. Oi, Thiana!
    Adorei que a autora tenha colocado elementos para a representatividade. Com certeza devem vir a existir mais livros assim.
    Ouço muita gente falar da série Irmandade na Adaga Negra, sempre tive curiosidade, mas é uma série extensa demais.
    Fiquei curiosa com o livro "Entrelace". ^^
    Parabéns pela entrevista!
    Beijão!
    http://www.lagarota.com.br/
    http://www.asmeninasqueleemlivros.com/

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  5. Olá,

    Estou muito feliz em saber que a Diana está crescendo cada vez mais. Já li várias resenhas de seus livros e tenho muita vontade em fazer a leitura, mas até hoje não surgiu uma oportunidade, só que ainda estou no aguardo. Adorei a entrevista, me ajudou a conhecer melhor o trabalho da autora! ♥

    → desencaixados.com

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  6. Oi, tudo bom?
    Adorei a entrevista, gostei que a autora tenha colocado alguns elementos representativos. Por mais livros assim, por favor! Ainda não li "A Irmandade da Adaga Negra" por ser uma série enorme, mas tenho vontade. O livro "Entrelace" me chamou mais a atenção, espero lê-lo em breve. Parabéns pela entrevista.

    Beijos, Rob
    www.estantedarob.com.br

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  7. Olá, tudo bem?
    Adorei a entrevista e gostei muito da autora, o fato dela querer uma representatividade para os deficientes é muito legal, porque raramente vemos livros em que esses personagens se aceitam de verdade, então a ideia dela é realmente interessante, fiquei curiosa pra ler os livros pois não os conhecia até então. Vou por na minha listinha, beijos.

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  8. Oieee que entrevista mega interessante... Não conhecia a autora é as suas obras, mas achei bem interessante o seu jeito de escrever pelo que disse na entrevista... É bem raro termos livros no qual os personagens tem alguma deficiência e isso despertou minha curiosidade.

    Beijos

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  9. Adorei a entrevista e a autora parece ser super gente fina! Adoro esses quadros de entrevista porque eles possibilitam que o leitor conheça melhor os autores. Estou com Uma Chance Para Recomeçar na lista de leituras obrigatórias do mês de abril.

    beijinhos!

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  10. Olá!
    Adorei poder conhecer um pouco mais da autora! Já tinha ouvido falar sobre ela é seu livro, mas jamais imaginaria que ela possui uma deficiência e por isso alguns personagens são retratados assim.
    Beijos.

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  11. Oi! Já tinha lido algumas resenhas do livro Uma Chance para Recomeçar, e pelos comentários excelentes não pude deixar de ficar curiosa com a história. Adorei conhecer melhor sobre a autora e a ideia de buscar representatividade nos livros para pessoas com deficiência me fez ter ainda mais interesse em conhecer sua escrita. Muito sucesso! :*

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  12. Olá!! :)

    Eu não conhecia a autora, mas o livro sim, e acho que a entrevista foi interessante por isso, para saber quem esta por tras... :)

    Bem, foi bom saber de onde veio o poema inicial, e também desse bloqueio criativo que melhorou a história! :)

    Boas leituras!! ;)
    no-conforto-dos-livros.webnode.com

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  13. Oie
    que bela entrevista, fico feliz pela autora, eu já tenho um aqui dela e estou ansiosa para começar ainda mais pós está entrevista, sempre da uma animação conhecer mais sobre quem esta escrevendo pois me sinto mais conectada com a história

    beijos
    http://realityofbooks.blogspot.com.br/

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  14. Que entrevista mais interessante! Não sabia que a autora tinha deficiência, por exemplo! E acredito muito quando ela se vê representada em personagens com deficiencia, pois também me vejo representada com personagens com as mesmas caracteristicas que eu. A dedicação que ela tem também dá a criação dos mesmos é maravilhosa!

    Fiquei encantada com o trabalho da autora e com sua entrevista!

    Abraços!
    www.asmeninasqueleemlivros.com

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  15. Olá Thiana! Que bom conhecer um pouco sobre uma autora brasileira. Confesso que ainda não conhecia nem a autora e nem seus livros, mas fiquei encantada pelo enredo e pretendo ler o mais rápido possível. Parabéns pela iniciativa em entrevistar a autora, ajuda muito a divulgar o trabalho. Sucesso para a Diana e para o seu blog também.

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    1. Olá,
      Quem bom que curtiu a entrevista e espero que possa conferir os livros da Diana.
      Bj

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